07 abril, 2019

A importância da Osteopatia e a importância de esperar: 2 observações

Nas últimas 2 semanas recebi 2 pacientes que me fazem escrever, são as que estão mais vivas na memória…mas muitos mais haveria. Na experiência que a vida clínica me dá, cada vez entendo melhor a importância extrema de um profissional de saúde como um Osteopata. Aquele que é “especialista” em fazer relações de sintomas, aquele que vê um paciente numa perspectiva de tensegridade, aquele que conhece a anatomia por baixo dos dedos, que relaciona o movimento com as interfaces, aquele que sabe sobre um pouco de tudo e que lhe permite uma avaliação multi- sistémica inter-relacionando os achados e sintomas, aquele que se torna um verdadeiro Poirot, do raciocínio até a um possível diagnóstico. 

Paciente 1: trauma há 5 anos. Desenvolveu-se uma dor aguda na perna e pé. Dos 5 anos, 2 foram sem dor diária. Entre Neurologia, Reumatologia, Ortopedia, Fisiatria, Fisioterapia, Medicina Familiar, muito dinheiro, tempo e uma perspectiva de melhoras (ou de um diagnóstico) muito ténue. Em 10 minutos fizemos um diagnóstico e traçamos um plano terapêutico. Pela primeira vez sentiu que alguém entendeu o problema e teve um diagnóstico que faz sentido. O bom é que tenho total confiança que estou certo. O bom, é que foi fácil lá chegar. O mau, é que houveram outros profissionais de saúde que sempre desaconselharam procurar um Osteopata.


Paciente 2: Sintomas de cervicobraquialgia (dor cervical e braço) que não só se agravaram, mas surgiram outros mais complexos, como causa iatrogénica (após cirurgia “experimental”). Os sintomas novos são tão complexos que podem ter várias etiologias (causas). Um delas é de certeza “mecânica” como consequência de uma cirurgia que não deveria ter acontecido, outras causas subjacentes poderão ser reumáticas e endócrinas. Outro exemplo de uma paciente que anda há 2 anos de profissional para profissional e a noção que só se fecham portas e afunilam-se as opções. Outro caso, em que procurar um Osteopata foi uma boa opção. Não só pelo processo terapêutico Osteopático, como pela relação inter-disciplinar com outros médicos, encaminhando a paciente.
Com todo o merecido respeito para com outras profissões de saúde, e com as quais me relaciono, mas cada vez tenho mais brio na minha profissão e confiança no papel importantíssimo do Osteopata. Por tanto que tem de saber, pela sua contínua aprendizagem, por beber de várias áreas das ciências biomédicas, por ter tempo, por ser especializado na palpação, na anatomia, fisiologia articular, neurofisiologia, no movimento, na postura, por ser um profissional de saúde de primeiro contacto, e por isso, ter de saber um pouco de tudo, por ser aquele profissional que faz relações de sintomas numa óptica global, por ser o especialista do corpo mecânico entendo o papel do sistema nervoso. Cada um no seu espaço e o Osteopata tem o seu lugar, muito importante, nas profissões de saúde.


Dito isto, é importante deixar claro que a Osteopatia tem ganho destaque, simpatia e confiança dentro da classe médica e não só. Caminha-se para bom porto mas ainda há muito para caminhar. O grande marco deste caminho foi o início da regulamentação e a sua conclusão em 2013-16. As 2 grandes vitórias desta regulamentação foram ter sido reconhecida a autonomia profissional/ deontológica e a batalha do IVA. Não caiu bem a alguns (muitos) mas não podíamos desejar melhor. É expectável que uma profissão relativamente nova, regulamentada com outras 6 totalmente distintas, ganhe críticos, anticorpos, ou devo dizer “inimigos”. Destes, punha as minhas mãos no fogo que mudariam de opinião se de facto conhecessem a Osteopatia e a ciência por detrás, se fossem mais além da Wikipédia e do que se escreveu no séc. XIX. Há um longo caminho ainda a percorrer e deve ser feito com paciência. Às vezes, saber esperar é mais importante do que agir. Recentemente foi lançada uma petição com o objetivo de incluir as denominadas TNC no SNS…faz-me lembrar aquelas pessoas que não tem noção do pedir. “Dá-se uma mão e pedem o braço todo”. Numa altura em que ainda nos estamos a solidificar enquanto profissão, enquanto ciência, em que ainda somos o “enteado pobre”, mas a quem foi dado mais do que a muitas outras profissões de saúde, ainda há pouco mais de 2 anos, já se quer que o Estado aceite no SNS as TNC (entre estas, muitas que carecem verdadeiramente de evidência para o que dizem tratar). A Osteopatia não pode ir atrás das vontades “excêntricas” de alguns. Ainda mais, sabendo-se à priori que é uma discussão perdida à partida. A Osteopatia deve afirmar-se enquanto profissão singular, não temos uma identidade comum “TNC”, embora infelizmente tenhamos sido assim batizados em 2003. Há 2 anos que digo que é importante sairmos do chapéu "TNC" que engloba 7 terapêuticas. Somos cada vez mais com esta opinião e temos de ter cuidado com o que assinamos por baixo. Esta não será a altura certa. Ano de eleições, cédulas pós- 2013, outros tantos ataques, mas com paciência e a virtude de esperar há-de chegar o momento. Até lá, continuemos a demonstrar o valor do nosso papel e a contemporaneidade da evidência. Há os que seguem o que já foi feito. 
Há os que criam novos caminhos. Assusta-me o “seguidismo”. Continuemos este belo passeio pelos próprios pés.

02 março, 2019

Paralisia de Bell- efeito da neuromobilização

Mobilização do nervo facial, ramo intermédio- fibras parassimpáticas lacrimais. Estas fibras não acompanham as restantes fibras do nervo facial, que são de sensibilidade geral, motoras e parassimpáticas para glândulas salivares e lacrimais, ou seja, não vão para o meato acústico interno/ externo (MAI/ MAE) e ouvido médio. Fazem sim, sinapse no gânglio pterigopalatino, terminando na glândula lacrimal. 

Este é um excelente exemplo de 2 aspetos fundamentais da mobilização do sistema nervoso: 1- tensegridade do tecido conjuntivo nervoso; 2- mecânica intimamente ligada à fisiologia (fisiomecânica).

A mobilização dos ramos faciais pelo meato acústico tem um efeito direto em ramos axonais mais distantes (lacrimais), mesmo tendo trajetos anatómicos diferentes. 

A paciente tem paralisia de Bell (paralisia do nervo facial) direita. Ao fim de alguns segundos de mobilização do MAE pela tração da concha cava e antitragus, notou-se a produção de bastante lágrima ipsilateral (a foto não faz justiça).

Este fenómeno não acontece num nervo saudável, mas em fenómenos de fibrose e mecânossensiblidade aumentada, a tensão visco-elástica é maior, e por isso, uma maior facilidade em criar potenciais de ação ectópicos. Esta é uma evidência clara (embora seja um case study) do efeito da neuromobilização.

Imaginem uma kinesiotape e cortarem uma das extremidades em várias tiras sem nunca as separar da tape (foto). Criar tensão numa só ponta, vai sempre criar tensão (visco- elasticidade) na restante tape.



16 fevereiro, 2019

Symptom perception, placebo effects, and the Bayesian brain

Artigo na íntegra sobre um tema muito interessante e que ilustra uma mudança de paradigma do modelo biomédico, na interpretação do efeito placebo e nocebo. Tanto um como outro são respostas de um sistema nervoso central ativo e são uma parte integrante na cura e nos sintomas do paciente. Entender estes importantes mecanismos e torná-los inclusivos na terapêutica e prognóstico (em vez de os considerar como uma resposta aberrante) é uma mudança de paradigma.

Boa leitura !

Symptom perception, placebo effects, and the Bayesian brain

Giulio Ongaroa, Ted J. Kaptchukb

"...Conclusion: Symptoms without a physical cause and relief through placebo intervention are anomalies for the biomedical model of disease. The Bayesian approach to perception explains and accommodates these 2 phenomena. It exposes placebo and nocebo effects, not as aberrant events, but as facets of the overall modus operandi of the nervous system. It shows, also, that these act on the same inferential processes as “real” disease and “real” treatments do. The implication of this approach is that, to be truly patient-focused, medicine must attend to the predictive process that lies at the basis of symptom perception, and thereupon evaluate what efficient courses of action can lead the brain to predict the body’s health."

3http://eprints.lse.ac.uk/90458/1/Ongaro_Symptom%20perception_2018.pdf

04 fevereiro, 2019

Fascial tissue research in sports medicine: from molecules to tissue adaptation, injury and diagnostics: consensus statement


Zügel MMaganaris CNWilke J, et al. Fascial tissue research in sports medicine: from molecules to tissue adaptation, injury and diagnostics: consensus statement


Abstract


The fascial system builds a three-dimensional continuum of soft, collagen-containing, loose and dense fibrous connective tissue that permeates the body and enables all body systems to operate in an integrated manner. Injuries to the fascial system cause a significant loss of performance in recreational exercise as well as high-performance sports, and could have a potential role in the development and perpetuation of musculoskeletal disorders, including lower back pain. Fascial tissues deserve more detailed attention in the field of sports medicine. A better understanding of their adaptation dynamics to mechanical loading as well as to biochemical conditions promises valuable improvements in terms of injury prevention, athletic performance and sports-related rehabilitation. This consensus statement reflects the state of knowledge regarding the role of fascial tissues in the discipline of sports medicine. It aims to (1) provide an overview of the contemporary state of knowledge regarding the fascial system from the microlevel (molecular and cellular responses) to the macrolevel (mechanical properties), (2) summarise the responses of the fascial system to altered loading (physical exercise), to injury and other physiological challenges including ageing, (3) outline the methods available to study the fascial system, and (4) highlight the contemporary view of interventions that target fascial tissue in sport and exercise medicine. Advancing this field will require a coordinated effort of researchers and clinicians combining mechanobiology, exercise physiology and improved assessment technologies.









Chronic pain as a symptom or a disease the IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases



Abstract


Chronic pain is a major source of suffering. It interferes with daily functioning and often is accompanied by distress. Yet, in the International Classification of Diseases, chronic pain diagnoses are not represented systematically. The lack of appropriate codes renders accurate epidemiological investigations difficult and impedes health policy decisions regarding chronic pain such as adequate financing of access to multimodal pain management. In cooperation with the WHO, an IASP Working Group has developed a classification system that is applicable in a wide range of contexts, including pain medicine, primary care, and low-resource environments. Chronic pain is defined as pain that persists or recurs for more than 3 months. In chronic pain syndromes, pain can be the sole or a leading complaint and requires special treatment and care. In conditions such as fibromyalgia or nonspecific low-back pain, chronic pain may be conceived as a disease in its own right; in our proposal, we call this subgroup “chronic primary pain.” In 6 other subgroups, pain is secondary to an underlying disease: chronic cancer-related pain, chronic neuropathic pain, chronic secondary visceral pain, chronic posttraumatic and postsurgical pain, chronic secondary headache and orofacial pain, and chronic secondary musculoskeletal pain. These conditions are summarized as “chronic secondary pain” where pain may at least initially be conceived as a symptom. Implementation of these codes in the upcoming 11th edition of International Classification of Diseaseswill lead to improved classification and diagnostic coding, thereby advancing the recognition of chronic pain as a health condition in its own right.




Treede, Rolf-Detlefa; Rief, Winfriedb; Barke, Antoniab; Aziz, Qasimc; Bennett, Michael I.d; Benoliel, Rafaele; Cohen, Miltonf; Evers, Stefang; Finnerup, Nanna B.h,i; First, Michael B.j; Giamberardino, Maria Adelek; Kaasa, Steinl,m,n; Korwisi, Beatriceb; Kosek, Evao; Lavand'homme, Patriciap; Nicholas, Michaelq; Perrot, Serger; Scholz, Joachims; Schug, Stephant,u; Smith, Blair H.v; Svensson, Peterw,x; Vlaeyen, Johan W.S.y,z,aa; Wang, Shuu-Jiunbb,cc


PAIN: January 2019 - Volume 160 - Issue 1 - p 19–27doi: 10.1097/j.pain.0000000000001384




Pregnancy Research on Osteopathic Manipulation Optimizing Treatment Effects: The PROMOTE Study A Randomized Controlled Trial

Kendi L. HENSEL, DO, PhD, Steve BUCHANAN, DO, FACOOG (Dist), Mayra RODRIGUEZ, MPH, des Anges CRUSER, PhD

Abstract

Objective—To evaluate the efficacy of Osteopathic Manipulative Treatment (OMT) to reduce low back pain and improve functioning during the third trimester in pregnancy and improve selected outcomes of labor and delivery.

Study Design—PROMOTE was a randomized, placebo-controlled trial of 400 women in their third trimester. Women were randomized to usual care only (UCO), usual care plus OMT (OMT), or usual care plus placebo ultrasound treatment (PUT). The study included seven treatments over nine weeks. The OMT protocol included specific techniques administered by board-certified OMT specialists. Outcomes were assessed using self-report measures for pain and back-related functioning, and medical records for delivery outcomes.

Results—There were 136 women in the OMT group, 131 in PUT, and 133 in UCO. Characteristics at baseline were similar across groups. Findings indicate significant treatment effects for pain and back related functioning (P<.001 for both), with outcomes for the OMT group. Similar to that of the PUT, but both groups were significantly improved compared to UCO. For secondary outcome of meconium- stained amniotic fluid there were no differences between the groups.

Conclusion—OMT was effective for mitigating pain and functional deterioration compared to the UCO group; however OMT did not differ significantly from PUT. This may be attributed to PUT being a more active treatment than intended. There was no higher likelihood of conversion to high risk status based on treatment group. Therefore, OMT is a safe, effective adjunctive modality to improve pain and functioning during their third trimester.


Published in final edited form as:
Am J Obstet Gynecol. 2015 January ; 212(1): 108.e1–108.e9. doi:10.1016/j.ajog.2014.07.043.

02 fevereiro, 2019

Medo da dor e lesão

A Osteopatia é muito mais do que manipular articulações ou músculos. Na verdade está tudo, ou quase tudo no sistema nervoso central. Afinal tudo em nós está em permanente movimento e comunicação. Só 20% do nosso input/ output é nociceptivo e motor. O resto é proprioceptividade, memória, emoções, intimamente ligados ao SN autónomo e glândulas. Cabe ao Osteopata contemporâneo entender esta complexidade de informações aplicando a simplicidade do toque com a intenção de um novo "reset" no paciente cujo sintoma é a "dor".

Aqui fica um link de um trabalho cada vez mais multidisciplinar e transversal às áreas que atuam na dor e movimento.

-Fearing Pain and Injury-

https://www.facebook.com/Aspetar/videos/581839102316175/?t=1